25.12.10
7.2.10
Para a árvore mãe
6.12.09
Breve Retorno na Picareta Cultural de 2009
Ao meu irmão Vitinho
Foste um cometa
de brilho, luz e força
inesquecíveis.
Em 23 anos
vivestes tudo:
a alegria de ser criança
e brincar o dia com liberdade
conheceu o amor em família
pai, mãe, irmãos, primos, tios
e a cada dia um novo amigo
sempre reunidos
em sorrisos e brindes
em volta da mesa
também chorou
a mais pura lágrima
na tristeza e na saudade
da perda
e sempre soube fugir
da agonia da cidade
para respirar e sentir
a paz da natureza
acampou, surfou, esquiou
atravessou desertos,
montanhas de neve,
se abençoou em Machu Pichu
teve a alegria de ver
o seu time de coração campeão
num Maraca lotado
verde, branco e grená
conheceu e intensamente viveu
todo o prazer do grande amor
único, eterno, verdadeiro e inesquecível
fez pelo mundo
uma imensidão de amigos
aprendeu, ensinou,
compartilhou tudo o que sabia
fez valer a cada momento
o sabor da palavra VIDA
e partiu antes de todos
para esta grande e misteriosa viagem
fez cada um se aprofundar
neste sentimento chamado saudade
e em mim plantou a certeza
da existência
na eternidade.
Rodolfo Muanis, Junho de 2009.
5.3.09
Estaremos sempre juntos irmão!
Eu somente passei para o outro lado do caminho
Eu sou eu, vocês são vocês
O que eu era para vocês, eu continuarei sendo
Dêem-me o nome que vocês sempre me deram
Falem comigo como vocês sempre fizeram.
Vocês continuam vivendo no mundo das criaturas,
Eu estou vivendo no mundo do Criador.
Não utilizem um tom solene ou triste,
Continuem a rir daquilo que nos fazia rirmos juntos.
Rezem, sorriam, pensem em mim.
Rezem por mim.
Que meu nome seja pronunciado como sempre foi,
Sem ênfase de nenhum tipo,
Sem nenhum traço de sombra ou tristeza.
A vida significa tudo o que ela sempre significou,
O fio não foi cortado.
Por que eu estaria fora dos seus pensamentos,
Agora que estou apenas fora de suas vistas?
Eu não estou longe,
Apenas estou do outro lado do Caminho.
Você que ficou aí, siga em frente,
A vida continua,
Linda e bela como sempre foi."
Santo Agostinho
11.10.08
Este blog saiu de férias
me pediu em segredo
que queria
um pouco de aconchego
aqui pelos papéis de casa
em cartas e palavras
e até pequenos sarais
exclusivos para minha amada.
Preciso lapidar
o que a caneta
Aprimorar na poesia
entender seu motivo.
O que está por aqui
fica de presente
para ser lido.
O que vem por aí
lapido com carinho
para quem sabe
8.10.08
inéditos XXIV
Eu ainda prefiro
a camisa de malha promocional
ou aquela de bloco do carnaval passado
meu jeans surrado e confortável
meu sapato tão usado
e ‘carregado de distâncias’.
Não me critique
se pego os meus 100 do bolso
e compro uma boa garrafa de vinho
e continuo vestindo a moda
de alguns anos atrás.
Prefiro o corpo
por dentro aquecido
a cabeça iluminada de idéias
e o sangue circulando livre pelas artérias
ao invés
de uma capa engomada
e um julgamento pré-concebido
daquilo que o homem pode ser.
Não é pelo meu manequim
que você vai me conhecer.
Se quiseres saber de mim
é melhor abrir aquela garrafa
e brindar comigo pela madrugada.
Aí sim vai sair encantada!
E nunca mais se iludirás
com um homem de terno e gravata.
21.9.08
canções que tocam no meu ipod (I)
Vitor Ramil
Vento
Quem vem das esquinas
E ruas vazias
De um céu interior
Alma
De flores quebradas
Cortinas rasgadas
Papéis sem valor
Vento
Que varre os segundos
Prum canto do mundo
Que fundo não tem
Leva
Um beijo perdido
Um verso bandido
Um sonho refém
Que eu não possa ler, nem desejar
Que eu não possa imaginar
Oh, vento que vem
Pode passar
Inventa fora de mim
Outro lugar
Vento
Que dança nas praças
Que quebra as vidraças
Do interior
Alma
Que arrasta correntes
Que força os batentes
Que zomba da dor
Vento
Que joga na mala
Os móveis da sala
E a sala também
Leva
Um beijo bandido
Um verso perdido
Um sonho refém
Que eu não possa ler, nem desejar
Que eu não possa imaginar
Oh, vento que vem
Pode passar
Inventa fora de mim
Outro lugar
Vitor Ramil e Marcos Suzano no disco Satolep Sambatown
--------------------------
Dia cinza
frio e chuva
pedalei
passei a Baía
pouso de lindo poema
passei o Aterro
chão do primeiro tombo
passei a Marina
morada de antigos sonhos
passei o MAM
residência do silêncio
cheguei ao aeroporto
na rampa aviões decolavam
pássaros de ferro desafiando a tempestade
e voltei
uma água de coco
uma canção sobre o vento
que soprou aqui por dentro
Dolfo, 21 de Setembro de 2008.
11.9.08
Poemas que habitam a minha memória (I)
de Martinho Santafé
Às vezes, era o Rio Paraíba do Sul
que desmesuradamente crescia.
E as ruas ficavam cheias de escorpiões,
cobras d´água, lacraias com mil pernas...
parecia um monstro epiléptico e barrento
numa corrida maluca até o mar.
A gente torcia para que o rio subisse mais,
cada vez mais,
para que alguma tragédia
se consumasse, como no cinema.
Queríamos ver casas desabando,
árvores arrancadas à força,
as meninas, descalças,
impedidas de ir à missa dominical,
bêbados patinando no caos,
arrastados até a foz de Atafona,
numa infinita poça de lama e cuspe
que mandávamos para o céu.
Estávamos prenhes de vida
e queríamos a morte de mentirinha.
Sonhávamos com o apocalipse doméstico,
com a bomba asfixiando nossos pré-sonhos.
O primeiro amor estava ao lado,
nas aulas do Liceu
que, às vezes,
assassinávamos com delicado prazer.
No verão de 66,
o rio ficou irado de verdade,
se emputeceu, invadiu o baú
onde eu guardava meus gibis
trocados antes das matinês do Cine Coliseu.
Adeus minha coleçãotão preciosamente inútil
de David Crocket, Buffalo Bill, Zorro,
Rock Lane, Cavaleiro Negro e etc.
E me lembro dessa grande enchente,
da aniquilação dos pessegueiros,
das parreiras, dos limoeiros, dos frangos,
da horta que minha avó tão bem cuidava.
Abius, mangueiras, bananeiras,
caramboleiras, formigas,
tudo se foi com o rio,
com essa referência geográfica
e conceitual que ainda hoje tento traduzir.
Tudo se foi com o boi morto
no meio da correnteza,
coberto de urubus.
E no radinho de pilha de s´eu Bertolino
(que, em uma canoa, ajudava as famílias
a recolherem seus pertences),
os Beatles cantavam “I wanna hold your hand”.
Comecei a crescer com os Beatles
(e eles comigo),
a respeitar o rio e a temer s´eu Leleno,
meu vizinho e flamenguista doente,
que nas tardes de domingo,
quando o seu time perdia,
enfiava a porrada na Dorotéia,
sua mulher - e maior torcedora do Flamengo,
por motivos amplamente justificados.
Também havia a Josete,
que ajudou a me descriar
e que tinha um namorado chamado Jomar,
um refinado sem vergonha.
Em 62, o Brasil foi bi-campeão
e Josete imaginava
Jomar fazendo gols nela.
Se Josete gozava, o fazia discretamente,
como os anjos gozam. No silêncio.
Josete, que hoje é avó,
era filha de Neco Felipe,
um negro caolho e feliz,
que organizava os forrós
em Conselheiro Josino,
interior de Campos dos Goytacazes.
Forrós animados com cachaça, lampiões,
sanfona e alguma voz desdentada,
uivando para a Lua, nas quentes madrugadas.
Além de Neco Felipe,
conheci outras pessoas felizes
que moravam naquela vila
no verdadeiro cú do mundo,
entranhada na miséria e nos canaviais
(os dois sempre andaram juntos),
com um cemitério
na beira da estrada.
Minha cabeça
se embaralhou toda:
- como é que as pessoas
podiam ser felizes
em Conselheiro Josino?
Como é que as pessoas
podiam ser felizes
naquela merda,
ao lado de um cemitério mambembe,
perto de um rio carregando tudo?
Como é que as pessoas
podiam ser ?
Mas as pessoas
eram
e algumas até se
foram.
----------------------------------------------------
Me lembro do impacto de quando ouvi este poema a primeira vez. Era o IV FestCampos de Poesia Falada, onde eu apresentava um poema, e estava lá o próprio Martinho Santafé, poeta de Macaé, que recitou esta pérola. Ele havia ganhado o mesmo festival no ano anterior com este poema. Agora, em meu novo trabalho, o rio que carregava tudo, novamente se colocou diante de mim. E vai ser bom poder fazer algo de bom pelas pessoas que serão, pelas que são, e até pelas que já se foram.
8.9.08
inéditos XXIII
Na noite passada
enquanto nos amávamos
variando as posições do Kama Sutra sobre o lençol...
Tive a vontade de ser escultor.
Para talhar
em ferro, bronze, ouro, prata, madeira
a delicadeza feroz do nosso amor.
Deixar exposto às intempéries,
eternizado em praças,
ruas, museus, casas,
a perfeição de nossos encaixes.
Transformar esta vida
estes momentos de puro gozo
em arte.
Aos falsos doutores da Academia
28.8.08
inéditos XXII
nenhuma palavra
ou melhor
apenas uma
(eita)
no peito uma dor
suave dor
brisa na espinha
o dia segue
é preciso sorrir
fingir que tudo está bem
ir para a aula
conversar em família
ler teorias
na noite penso nela
seguro os dedos
para não ligar
sinto-a bem
forte e sorrindo
sinto o seu brilho
de longe, distante
não sou dele o motivo
já fui
revejo nossas fotos
nelas há felicidade
que num belo momento
se dissipou, e em mim
virou saudade
não sei
onde guardar meu amor
dolorido e machucado
pelo silêncio
nunca mais cartas
nunca mais mensagens
nunca mais ela sorrindo
me chamando de moço lindo
fiquei mal acostumado
com teu tom de desejo
de paixão embalando o peito
ela não me quer mais
e isso dói fundo
pois o amor ainda é muito
mas
sinto-a bem
forte e sorrindo
sinto o seu brilho
de longe, distante
não sou dele o motivo
irei me curar
entre batuques
esta cidade
e o mar
amanhã cedo
começo a renascer
21.8.08
O dia em que quase morri (VI)
um médico chega
- o que houve?
- me fecharam na estrada
ele olha as radiografias e diz:
- você nasceu de novo
- só quebrou a clavícula
- mas e essa dor no peito doutor?
- eu não consigo respirar
- isto é dá pancada
- você está todo inchado por dentro
- vai doer quando tossir, rir e respirar
- mas depois vai melhorar
- você consegue andar?
levanto da maca e caminho com dificuldade
- vá a sala de gesso imobilizar esta clavícula
- depois limpe os ferimentos e está liberado
19.8.08
O dia em que quase morri (V)
- chegamos!
saio da ambulância em uma maca
luzes
pessoas
luzes
pessoas
luzes
pessoas
sou deixado em uma sala
de luzes apagadas
onde ao fundo
uma mulher grita
o médico da ambulância fala:
- acidente de moto
- mas ele está bem
- só sofreu uma lesão de tórax
continuo respirando lentamente
e com muita dor
o telefone toca
atendo
- sofri um acidente
- mas estou bem
- no hospital de Itaboraí
- e esse aqui?
- leva pro raio-x!
luzes
pessoas
luzes
pessoas
luzes
pessoas
1, 2, 3
meus ossos soltos
batucam entre a maca
e o raio-x
luzes
pessoas
luzes
pessoas
luzes
pessoas
agora estou num corredor
chegam dois patrulheiros
- o que houve?
- me fecharam, um carro branco...
- a pessoa foi presa
- responderá por tentativa de homicídio
- você terá que ir na delegacia depor
- sua moto e documentos estão na PRF de Rio Bonito
18.8.08
O dia em que quase morri (IV)
- sente as pernas, movimenta os braços?
- tudo ok. só dói aqui no peito,
- lado esquerdo
- não consigo respirar
me imobilizam todo
1, 2, 3
me colocam na maca
sinto os ossos soltos por dentro
me colocam na ambulância.
me dão uma máscara com oxigênio
a porta se fecha,
mas a ambulância não sai
pessoas discutem lá fora
a porta se abre
uma pessoa entra e fala:
- guarda meu nome
- Sargento Alves
- do Corpo de Bombeiros de Cabo Frio
- eu vinha atrás de você na estrada
- eu vi tudo. prendi o cara lá na frente
ele me entrega um papel
com nome e telefone
e coloca no meu bolso
ele sai
a porta se fecha,
mas a ambulância não sai
a dor é forte, o ar e pouco, a agonia imensa
a porta se abre e alguém grita:
- me perdoa! me perdoa!
faço sinal de positivo
eu só quero ficar vivo
a porta se fecha
a ambulância começa a andar
a cada sacolejo muita dor
16.8.08
O dia em que quase morri (III)
uma mulher nervosa fala:
- nossa, aqui é foda.
- é um trecho deserto da br 101
um rapaz fala:
- a ambulância sai de Itaboraí
- deve levar uns 10, 15 minutos
o sol do meio-dia
é luz forte no azul.
iluminando meu rosto
não é a luz do infinito
é só o sol
ainda não é o meu fim
sinto vontade de chorar
penso na minha família
na minha amada querida
não posso morrer
não quero morrer
rezo
alguém me pergunta como foi
- um carro me fechou
muita dor para falar
respiro lentamente
e me concentro
em ficar vivo
chega a ambulâncias dos bombeiros
14.8.08
O dia em que quase morri (II)
deito na grama ao lado da estrada
tento respirar bem devagar
muita dor
penso:
- devo estar todo furado por dentro
- hemorragia interna
- em breve vira o sangue pela boca
- o corpo frio. a morte
- Deus não me deixe morrer!
saco o celular do bolso
digito 1 9
chegam pessoas
- ele está vivo
- está respirando
- abre a jaqueta dele
- sente dor em algum lugar?
- só no peito
- lado esquerdo
- não consigo respirar
penso:
- só tenho um pulmão
- o direito
- vou com ele até o fim
começo a rezar
uma mulher grita:
- ele está tremendo!
- ele está gelado!
penso:
- se meu coração parar eles saberão me reanimar?
rezo
puxo e solto o ar
lentamente
muita dor
profunda dor no peito
bem perto do coração
12.8.08
O dia em que quase morri (I)
céu azul
estrada tranqüila
veículos se aproximando no retrovisor
(fechada)
céu
asfalto
céu
asfalto
céu
asfalto
corpo rolando
pelo matagal da estrada
moto caída no acostamento
20 metros da minha direção
fico em pé
tiro o capacete
movimento braços e pernas
tudo ok
- não acredito. não quebrei nada?
coração a mil por hora
puxo o ar
profunda dor no peito
não consigo respirar
30.7.08
Flip 2008! Poetas pelas ruas de Paraty! Parte 3
inaugural
cerveja cachaça
e muita gente
fazendo do barato
um momento sensacional
festa democrática
num off-flip de Paraty
era chegar sorrir e curtir
Caio Carmacho
piracicabano
do sorriso fácil
e copo cheio
paratyando
já alguns anos
Poeta e agitador cultural
acima de todos os conchavos
montou palco nas ruelas de pedra
para os desconhecidos se conhecerem
para todos perceberem
que a literatura
que a música
estão acima de ter que ser oficial
basta ser sincera e original
para irrigar a festa
o encontro
a paquera
e celebrar
o que a gente sempre quis
ser livre e feliz
Rodolfo Muanis, Julho de 2008.
13.7.08
Flip 2008! Poetas pelas ruas de Paraty! Parte 2
de olhar triste e sorriso fácil
Poeta urbano suburbano
Solitário pardal paulistano
Sobrevivendo em floresta cinza
Pousado em puleiro sujo
Observando bolhas de aço
carregando gente
Pelo orkut, de volta a Sampa, Baffo me mandou este
São Paulo
é uma calamidade.
Eu disse chuva
inundou a cidade.
Lá por Paraty eu fiz esse pra ele
Tu
é um poeta
de guarda-chuva
Eu
ainda me molho
Giovani é poeta pra valer, da poesia viva e fácil, de sorriso largo e coração grande, com guarda-chuva aberto para a amizade.
Pra fechar mais um dele
Vá mulher, alçar altos vôos
no imenso e multicolor mundo seu...
deixe-me rastejar na tacanhez
do opaco mundo meu.
Vá mulher, pode partir sem culpa e com calma
esqueça o poeta que lhe entregou a alma.
E esse mesmo poeta se cala
e vai dormir sem saber,
se o amor ajuda ou atrapalha
(Giovani Baffo - Paraty 2008)
Eu acho que só ajuda vêio. É só não driblar a trave e sair com bola e tudo. : )
Abraços!
3.7.08
Flip 2008!
20.6.08
Convite nas Coxas!
Não fomos convidados pra festa
mas como bons penetras
estaremos por lá pra comemorar.
Primeira Picareta Cultura de Paraty
E só chegar, confraternizar e curtir.
Não tá sabendo?
Clica aqui
http://www.melhorquenostemos.blogspot.com/
17.6.08
inéditos XXI
Brado de um poeta decepcionado
E como mentem
comumente
diariamente
chegam a criticar
aquilo que também fazem
deslavadamente
com seus títulos acadêmicos
colonialmente
com seus postos de doutor
mascarando suas incompetências
evidentemente aparentes
perante a vida.
Se escondem
por dentro de um terno
de uma gravata colorida
de uma roupa bonita
de um cabelo pintado
com tintas de mercado.
Forçam até mesmo
ao mais honesto
a mentir também
fingir que está tudo bem.
E de tanto mentir
a verdade
já foi esquecida.
Já te pedem
num olhar de cego
que a falsidade
seja mantida.
E sentam-se a mesa
mentem.
Trepam com suas esposas
mentem.
Trepam com suas amantes
mentem.
Com ambas
mal e porcamente.
Isso se é que ainda trepam
realmente.
Trabalham
8, 10, 12, 14, 18, 20, 22,
24 horas por dia mentem.
Passam a vida mentindo
e nos domingos de sol
sorrindo.
E eu
de saco cheio
de tanta mentira
de tanta hipocrisia
escrevo no poema
a verdade
já que por aí
ela está proibida.
17 de junho de 2008.
10.6.08
poemas que dormem na estante XIX
amor, que teço com teu fio? que traço
com teu raio, um risco, uma rosácea?
Rampante alfanje mandala que desfaço
e refaço num maio que me abala
a mente
amante
que constrange enlaço
***
amor. palavra gasta. arrisco
nos teus fios deixar-me
no teu charme no labirinto
do teu risco no sabor
da palavra gasta amor
nesse absinto tonto
de meu canto.
***
amor. os maios já se foram, ficam
figos ainda por colher. ficam
nas folhas luzindo os pirilampos
ardem em cio os campos
abrindo-se à raiz.
Ivo Barroso no livro A Caça Virtual, pág. 45, Editora Record.
2.6.08
Boaventura de Sousa Santos e a Escrita INKZ – anti-manifesto para uma arte incapaz (III)
Para não me desequilibrar
Tenho faro
Não preciso de complexidade
O tédio é a vingança dos mortos
Aos que vivem mortos
Canine wisdow
Boaventura de Sousa Santos, pg. 85, no livro A Escrita INKZ – anti-manifesto para uma arte incapaz, Editora Aeroplano.
13.5.08
poemas que dormem na estante XVIII
"AMIGOS:
em tempos de " apropriação" e malversação da obra alheia, circula na internet e no youtube uma versão pobre e estropiada do poema meu A IMPLOSÃO DA MENTIRA, publicado originalmente durante a última ditadura militar. Peço aos amigos que contra ataquem em seus blogs, sites e toda forma eletrônica de comunicação divulgando essa verdade textual.
Em tempo: cuidado com os que dizem que a verdade não existe e que é arte qualquer coisa que qualquer um chama de arte. É mais uma mentira a ser ex/implodida."
Grato pela divulgação, Affonso Romano de Sant’ Anna.
A Implosão da Mentira
Affonso Romano de Sant’ Anna
Fragmento 1
Mentiram-me. Mentiram-me ontem
e hoje mentem novamente. Mentem
de corpo e alma, completamente.
E mentem de maneira tão pungente
que acho que mentem sinceramente.
Mentem, sobretudo, impune/mente.
Não mentem tristes. Alegremente
mentem. Mentem tão nacional/mente
que acham que mentindo história afora
vão enganar a morte eterna/mente.
Mentem. Mentem e calam. Mas suas frases
falam. E desfilam de tal modo nuas
que mesmo um cego pode ver
a verdade em trapos pelas ruas.
Sei que a verdade é difícil
e para alguns é cara e escura.
Mas não se chega à verdade
pela mentira, nem à democracia
pela ditadura.
Fragmento 2
Evidente/mente a crer
nos que me mentem
uma flor nasceu em Hiroshima
e em Auschwitz havia um circo
permanente.
Mentem. Mentem caricatural-
mente.
Mentem como a careca
mente ao pente,
mentem como a dentadura
mente ao dente,
mentem como a carroça
à besta em frente,
mentem como a doença
ao doente,
mentem clara/mente
como o espelho transparente.
Mentem deslavadamente,
como nenhuma lavadeira mente
ao ver a nódoa sobre o linho. Mentem
com a cara limpa e nas mãos
o sangue quente. Mentem
ardente/mente como um doente
em seus instantes de febre. Mentem
fabulosa/mente como o caçador que quer passar
gato por lebre. E nessa trilha de mentiras
a caça é que caça o caçador
com a armadilha.
E assim cada qual
mente industrial? mente,
mente partidária? mente,
mente incivil? mente,
mente tropical?mente,
mente incontinente?mente,
mente hereditária?mente,
mente, mente, mente.
E de tanto mentir tão brava/mente
constróem um país
de mentira
-diária/mente.
Fragmento 3
Mentem no passado. E no presente
passam a mentira a limpo. E no futuro
mentem novamente.
Mentem fazendo o sol girar
em torno à terra medieval/mente.
Por isto, desta vez, não é Galileu
quem mente.
mas o tribunal que o julga
herege/mente.
Mentem como se Colombo partin-
do do Ocidente para o Oriente
pudesse descobrir de mentira
um continente.
Mentem desde Cabral, em calmaria,
viajando pelo avesso, iludindo a corrente
em curso, transformando a história do país
num acidente de percuso.
Fragmento 4
Tanta mentira assim industriada
me faz partir para o deserto
penitente/mente, ou me exilar
com Mozart musical/mente em harpas
e oboés, como um solista vegetal
que absorve a vida indiferente.
Penso nos animais que nunca mentem.
mesmo se têm um caçador à sua frente.
Penso nos pássaros
cuja verdade do canto nos toca
matinalmente.
Penso nas flores
cuja verdade das cores escorre no mel
silvestremente.
Penso no sol que morre diariamente
jorrando luz, embora
tenha a noite pela frente.
Fragmento 5
Página branca onde escrevo. Único espaço
de verdade que me resta. Onde transcrevo
o arroubo, a esperança, e onde tarde
ou cedo deposito meu espanto e medo.
Para tanta mentira só mesmo um poema
explosivo-conotativo
onde o advérbio e o adjetivo não mentem
ao substantivo
e a rima rebenta a frase
numa explosão da verdade.
E a mentira repulsiva
se não explode pra fora
pra dentro explode
implosiva.
(Poema publicado no JB em 1984, quando do episódio do Rio Centro e em diversas antologias do autor. Está em “ Poesia Reunida” L&PM, v.2)
11.5.08
Boaventura de Sousa Santos e a Escrita INKZ – anti-manifesto para uma arte incapaz (II)
têm algo de errado de origem
Desemedem-se com frequência
Ninguém se ocupa deste desespero
Mas sei que existe
Quando se senta num banco de jardim
Chega a casa mente passa adiante
Chega à cama mente adormece
Levanta-se mente desaparece
Não se imagina um cão
Mentir com tanta consistência
Boaventura de Sousa Santos, pg. 23, no livro A Escrita INKZ – anti-manifesto para uma arte incapaz, Editora Aeroplano.
1.5.08
Boaventura de Sousa Santos e a Escrita INKZ – anti-manifesto para uma arte incapaz
Esta postagem foi uma forma que encontrei de explodir ao mundo uma leitura que tem me acompanhado nas últimas semanas, a Escrita INKZ – anti-manifesto para uma arte incapaz, do sociólogo português Boaventura de Sousa Santos. Um livro de poesias? Um livro de prosas? Ou um livro de indagações perante a condição cada vez mais precária do ser humano no mundo? Apenas uma arte incapaz coloca Boaventura. Estará a nossa geração cometendo os mesmos erros de nossos pais e avós e produzindo uma arte totalmente incapaz? Eu, sinceramente, acredito que vale dar uma parada em todas as engrenagens e olharmos um pouco ao nosso redor e refletir.
( pequena pausa diante à possibilidade de cada um )
Bem ... seguem trechos do Desfácio desta obra interessantíssima. Em breve postarei dela alguns poemas-latidos.
“A minha geração não produziu nada de novo no domínio das artes. Isto não seria um grande problema se ela tivesse sabido usar produtivamente a sua esterilidade. Mas não foi o caso. Podia ter propiciado um novo encontro entre a arte e a vida. Devolver a arte a quem a trabalha quando trabalha. Mas tal não foi possível porque há páginas literárias, salas de concerto, departamentos de arte e de literatura, prêmios, galerias. A minha geração ficou assim condenada a celebrar a sua própria esterilidade e a usá-la para consumo interno. Por isso, já vimos tudo e, sobretudo, o déjà vu. Só não vimos artistas prontos a morrer. A minha geração não conheceu ninguém desse calibre. Em vez de morte, o cansaço. A minha geração foi feita de gente-cansaço, família-cansaço, sexo-cansaço, whisky-cansaço. Cansámos-nos para fugir ao imperativo da arte. Por fim, cansámo-nos para esquecer o cansaço. (...)
A Escrita INKZ não é poesia nem é prosa, não é pintura nem escultura, nem arquitectura. É uma arte incapaz. Não se sustenta nem se completa por si própria. Abre espaços para as manifestações artísticas dos outros, sejam eles artistas legais ou indocumentados, formais ou informais, oficiais, ou não-oficiais. (...)
A Escrita INKZ é incondicionalmente realista e a realidade que descreve pode ser pertubadora. Cada título ou estrofe é o princípio ou o fim de uma narrativa pessoal que cada leitor deverá imaginar e construir artisticamente. Porque o novo milênio ainda não conseguiu treinar a população em geral para este tipo de construção, há que ler e imaginar devagar. A Escrita INKZ é um medicamento escrito que deve ser consumido em doses individuais, segundo recomendações do próprio leitor. (...)
A Escrita INKZ é um conjunto de histórias rápidas e curtas para deixar espaço à imaginação artística de quem lê. (...)
A Escrita INKZ é uma arte incapaz porque só existe sob a forma de ausência ou emergência. A Escrita INKZ é uma ekfrase de tipo novo. A ekfrase é o termo de teoria literária para significar a descrição de uma obra de arte dentro de outra obra de arte. Por exemplo, um poema que descreve uma pintura. No caso da Escrita INKZ, a descrição é meramente potencial porque a obra de arte tem de estar ausente para que os leitores comuns e incomuns criem sobre ela as suas obras de arte. (...)
A Escrita INKZ parte da idéia que a subjectividade do novo milênio é constituída por seis mónadas: figura, cidade, andamento, momento, mulher nua e orador-nionguém. São o contrário dos heterônimos já que estão sempre presentes sob diferentes formas em tudo o que somos e, portanto, em toda a arte de que todos somos capazes. Todos somos figura, cidade, andamento, momento, mulher-nua e orador-ninguém. Cada um à sua maneira e segundo o tempo e o lugar. (...)
Além das seis mónadas, somos uma outra mónada, a mónada-cão. A mónada-cão é uma mónada muito especial porque não tem autonomia em relação às outras mónadas. A sua especificidade é ser a voz autônoma e livre das outras mónadas. Ou seja, cada mónada tem uma mónada-cão. Ao contrário do que pensava Leibniz, as mónadas não são entidades sem janelas. Têm janelas e essa janela é a mónada-cão.”
Boaventura de Sousa Santos no Desfácio do livro Escrita INKZ anti-manifesto para uma arte incapaz, págs. 11-17, Editora Aeroplano.
Observação:
Foram mantidas as normas e grafias de Portugal no recorte do livro.
Vocabulário :
Mónada: 1. Biol. Organismo ou unidade orgânica diminuta e muito simples. 2. Filos. Segundo Leibniz (v. leibniziano), cada uma das substâncias simples e de número infinito, de natureza psíquica (dotada de apercepção e apetição), e que não têm qualquer relação umas com as outras, que se agregam harmoniosamente por predeterminação da divindade, constituindo as coisas de que a natureza se compõe; enteléquia.
Enteléquia: Filos. 1. Segundo Aristóteles (v. aristotelismo), o resultado ou a plenitude ou a perfeição de uma transformação ou de uma criação, em oposição ao processo de que resulta tal criação ou transformação.
2. A forma ou a razão que determinam a transformação ou a criação de um ser.
3. Mônada (2).
Fonte: Dicionário Aurélio Eletrônico - Século XXI
19.4.08
inéditos XX
Quando me arrisquei poeta
desconhecia quantos éramos.
Hoje eu sei que somos muitos
incontáveis as tantas estrelas.
Bradei por aí minhas palavras
e por vezes me recolhi
para lapidar minha lavra.
Nos livros
amadureci a riqueza dos versos
e reconheci que este aprender
não terá fim, será eterno.
Nas ruas, bares,
festivais e espaços culturais
dei vida a muitos poemas
e nestes momentos me senti completo.
E diante a incompletude da vida
sempre busquei sobreviver por outros meios.
A poesia seria meu presente à humanidade.
Até tentei as revistas, os jornais,
alguns catedráticos literários,
alguns poetas marginais,
a cara a tapa nos recitais,
na busca da crítica que me fizesse crescer,
ou do reconhecimento que me permitisse aparecer.
Mas conclui que já estavam comprados
todos os espaços dos jornais.
Há um momento
em que se apaga o sonho de viver da arte.
Mas a arte não se apaga de dentro de você
e vamos sonhando enquanto vivemos.
Amadurecendo nossa essência a cada dia.
Isso sim é viver poesia.
Pousar o verso num espaço livre.
Recitar um poema por prazer
e com um único compromisso:
iluminar o leitor.
Não precisar mais do mercado,
do parecer positivo de doutores letrados,
nem de eventos oba-oba e conchavos.
Ser apenas se inspirar
e deixar-se ser inspirado.
Ser para o desconhecido leitor
um punho ou uma flor.
Arma branca com a qual
ele possa reinventar sua história.
E fazer do seu momento pessoal
de luta, amor ou solidão...
Um momento universal.
(Rodolfo Muanis, Abril de 2008)
15.4.08
inéditos XIX
Safra 2002 - Garrafa nº 2.498
Tua personalidade única
Tua cor rubi profunda
Com reflexos de púrpura
Tens notas de chocolate
Resquícios das especiarias
Que as naus buscavam no além mar
Tens taninos equilibrados
Na boca sabor de um beijo rosado
Daqueles que nos fazem sonhar
Corpo intenso e aveludado
Orgasmo nos lábios
(Rodolfo Muanis, Outubro de 2005)
10.4.08
inéditos XVIII
IV – Chardonnay Callia
na Madrugada que passou
inegável é o fato
de que domamos a tempestade
força do amor ou da vontade?
talvez tenha sido
o Chardonnay Callia em teus lábios
con collor amarillo intenso
y tus destellos verdosos
y tu aroma complejo
intensamente frutado
con bananas maduras
almendras tostadas,
duraznos y miel.
pleno e amplo em tua boca
trazendo aos nossos beijos
sabores frutados de abacaxi e pêra.
e eis que surge uma estrela
para eu fazer um pedido
que tenha certeza foi por nós dois
e depois,
posso dizer que aqueles fogos
explodindo sem nexo e sozinhos
eram os nossos corações
acionando os pavios de tantos carinhos.
(Rodolfo Muanis, Janeiro de 2008)
8.4.08
inéditos XVII
III – Ancelota / Tannat – Cave de Pedra Gran Reserva
a Urca de tantas batalhas esquecidas
com seus canhões adormecidos
enferrujando as histórias
a Urca de agora, amor inesquecível
nas areias a paixão acesa na memória
estrelas tantas, lua cheia, as marés
teus beijos, laços e abraços
e tantos carinhosos cafunés
és intensa, rubi profundo, límpida e cristalina
tens aroma de café e chocolate branco
amadurecendo em teus lábios
e equilibrando teu cassis
com mais um pouco viraríamos um cometa
entrelaçando corpos num universo sideral
chove o orvalho dos coqueiros
parecem saber de nossos desejos
da noite finda e o já anúncio da aurora
e descobrimos o encaixe perfeito
para nossa paixão ganhar duas rodas
(Rodolfo Muanis, Janeiro de 2008)